terça-feira, 30 de junho de 2015

A coragem, segundo opositores da FRELIMO

Transcorrem poucos dias depois de o deputado Venâncio Mondlane ter proposto a prisão do antigo Presidente moçambicano, Armando Guebuza, por alegadamente ter abocanhado recursos do Estado. Alguns compatriotas apelidam-no, mais uma vez, de “corajoso”. Muitas situações ou acções como as do deputado são chamadas de “corajosas”. Por qual razão tais afirmações, em parlamento ou na esfera pública, são adjectivadas de “corajosas”? Tentei pensar e levantar algumas hipóteses. (1) Alguns de nós somos “descendentes” do Império de Gaza. Quem pensasse diferente ou desconfiado a almejar o poder, poderia ser alvo a abater, ao mesmo tempo em que o colonialismo português assombrou-nos, por exemplo, com a sua PIDE. 2) Depois da Independência está, na memória viva de todos nós, o quão simultaneamente “satanás” e “deus” a FRELIMO desencadeou a sua política monopartidária.
3) Depois da guerra dos 16 anos circularam informações segundo as quais parte dos militares de ambos beligerantes que tinham tido a “coragem” de matar, sem escrúpulos, precisavam de banhos espirituais naqueles que se comunicam com deidades ou tratamentos de psicólogos, para não mais serem seguidos por fantasmas ou pessoas falecidas. A ideia é: “o africano não morre. Quem o mata sofrerá graves consequências simultaneamente espirituais e sociais – quiça políticas”; e 4) Depois da Constituição de 90’ até aos dias actuais, Moçambique continua a produzir cenários que podem colaborar com a “certeza” das perseguições, hoje, alegadamente produzidas pela FRELIMO, por isso quem o contraria é tido como “corajoso”.
Os elogios que verbalizamos de “corajosos” àqueles que têm oportunidade de propor agendas de democracia, de transparência, de direitos humanos e de desenvolvimento podem ser perniciosos na construção dos valores democráticos, uma vez que denunciar actos tidos como corrosivos ao Estado, em democracia, pressupõe a existência de leis republicanas que assim o advogam – e Moçambique tem a constituição democrática e as instituições que, ao seu modo, defendem os cidadãos. Talvez nós tenhamos parte importante de lideranças não governamentais com grande fragilidade moral e intelectual para fornecer uma agenda política de Estado, além da cidadania rancorosa contra o governo e suas autoridades. Por isso que qualquer acto, ampliado pela carismática Imprensa, é tido como “corajoso”. Ao meu modo e distante de Moçambique, tenho pensado, nos últimos tempos, que a FRELIMO seja talvez um “mal menor”, se comparada com a nossa mega-indústria dos seus opositores. A qualidade cidadã, a moral pública e a capacidade de mobilização da sociedade em torno de utopia não é encontrada, com aprovação e satisfação, na maioria daqueles que têm “dons messiânicos” e igualmente “corajosos” lá pelo Índico. Parece-me, por assim dizer, que quase sempre que algumas lideranças não governamentais procuram assaltar o Estado é porque “também chegou a nossa vez” e não necessariamente porque têm uma agenda de Estado e de sociedade justos.
Um jornalista, um deputado, um defensor de direitos humanos ou outro que defende transparência por que deve ser chamado de “corajoso”? Que condições sociais e políticas produzem um “corajoso”? Talvez as mulheres vendedeiras de amendoim torrado, de couve, de “xikalamidade” e outros produtos, nas nossas condições políticas, sociais e económicas, sejam mais corajosas, para enfrentar um “Estado sem noção de sê-lo” do que opositores da FRELIMO. Quem defende democracia, direitos humanos ou transparência em Moçambique está a defender agendas óbvias, em democracia constitucional – e o adjectivo “corajoso” não lhe assenta e nem lhe assiste, mas, certamente, o nome cidadão – e espero que este cidadão não faça parte do que chamo de cidadania rancorosa, que parece estar generalizada.
Dito isto, posso dizer que parece que temos “traumas” e “swikwembo”, segundo os quais a FRELIMO aguilhotina e mata do que “coragem” de sermos verdadeiramente republicanos. Os traumas e os nossos swikwebo do passado é que são a nossa coragem. Como diria um antropólogo, o passado persegue os actores sociais… Aqui, está a coragem, segundo Moçambique…
PS. Eu já sei quem será assessor de Imprensa na Presidência da República, caso a oposição dhlakamiana ganhe as eleições próximas. E sei, ainda, de que jornal sairá – a vez chegou, não pelo Estado e sociedade justos, mas por aquela viatura, aquele fato, aquelas viagens, aquelas mulheres, aquela casa, aquela fama…
Do vosso bantu-mahlazinense, perdido em águas atlânticas!
JB

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